segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Apesar de tudo, semeia

Se hoje acordares e vires a terra fendida, sedenta de água e de vida;
Se ao ergueres os teus olhos descobrires o sol encoberto pelos pássaros da destruição e pelo fumo que sobe, da terra ferida;
Se os gritos dos meninos-soldado e das mães sem filhos ecoarem bem fundo no teu peito;
Se hoje acordares e ouvires o mudo lamento de quem vive morrendo num leito
de sofrimento feito;
Se ao abrires os teus olhos vires homens vivendo na pobreza resignada
porque do solo que pisam brota a riqueza por tantos outros cobiçada;
Se hoje acordares e sentires que este mundo em que vives é teu,
e que em vez da escuridão e morte, poderia ser luz e céu;
Então, chora meu irmão!
Chora, irmão, mas que as tuas lágrimas não sirvam para lavar a tua consciência!
Chora, mas não permaneças chorando!
Ergue os teus braços e semeia. Semeia sempre!
Semeia na terra quente e seca, semeia na tempestade, mas semeia!
Espalha flores, sorrisos, canções de paz e alento.
Semeia ainda que digam que as tuas sementes serão espalhadas pelos homens e pelo vento.
Semeia, semeia sempre!
Ainda que o ribombar dos canhões faça tremer a tua mão
e as sementes não possam escolher o teu chão. Semeia meu irmão!
Ainda que o solo pareça recusar as sementes;
Ainda que as sementes não prometam fortes searas;
Semeia, semeia sempre!
Ainda que o solo esteja crivado de minas e balas;
Ainda que alguns queiram prender-te os braços e impedir-te de semear;
Semeia, irmão! Semeia sempre!
Ainda que chamem louca a essa tua vontade insistente de semear,
queiram emudecer a tua voz e fazer-te calar;
Nesta vasta seara chamada terra,
semeia paz nos campos da guerra.
Semeia sobretudo a esperança, a liberdade;
Semeia pão, vida, educação. Semeia dignidade!
Semeia sonhos, noites tranquilas, madrugadas serenas,
manhãs claras, tardes amenas.
Semeia asas para voar e braços estendidos para a todos abraçar.
Aqui, em Angola ou em Timor, semeia, irmão, semeia sempre!
Semeia sobretudo, Amor!
Olinda Ribeiro

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